quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Receita de mulher


As muito feias que me perdoem Mas beleza é fundamental. É preciso Que haja qualquer coisa de dança, qualquer coisa de haute couture Em tudo isso (ou então Que a mulher se socialize elegantemente em azul, como na República [Popular Chinesa). Não há meio-termo possível. É preciso Qu tudo isso seja belo. É preciso que súbito Tenha-se a impressão de ver uma garça apenas pousada e que um rosto Adquira de vez em quando essa cor só encontrável no terceiro minuto da [aurora. É preciso que tudo isso seja sem ser, mas que se reflita e desabroche No olhar dos homens. É preciso, é absolutamente preciso Que tudo seja belo e inesperado. É preciso que umas pálpebras cerradas Lembrem um verso de Eluard e que se acaricie nuns braços Alguma coisa além da carne: que se os toque Como ao âmbar de uma tarde. Ah, deixai-e dizer-vos Que é preciso que a mulher que ali está como a corola ante o pássaro Seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e Seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem Com olhos e nádegas. Nádegas é importantíssimo. Olhos, então Nem se fala, que olhem com certa maldade inocente. Uma boca Fresca (nunca úmida!) e também de extrema pertinência. É preciso que as extremidades sejam magras; que uns ossos Despontem, sobretudo a rótula no cruzar das pernas, e as pontas pélvicas No enlaçar de uma cintura semovente. Gravíssimo é, porém, o problema das saboneteiras: uma mulher sem [saboneteiras É como um rio sem pontes. Indispensável Que haja uma hipótese de barriguinha, e em seguida A mulher se alteie em cálice, e que seus seios Sejam uma expressão greco-romana, mais que gótica ou barroca E possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de 5 velas. Sobremodo pertinaz é estarem a caveira e a coluna vertebral Levemente à mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal! Os membros que terminem como hastes, mas bem haja um certo volume de [coxas E que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima [penugem No entanto, sensível à carícia em sentido contrário. É aconselhável na axila uma doce relva com aroma próprio Apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!) Preferíveis sem dúvida os pescoços longos De forma que a cabeça dê por vezes a impressão De nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre Flores sem mistério. Pés e mãos devem conter elementos góticos Discretos. A pele deve ser fresca nas mãos, nos braços, no dorso e na face Mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura nunca [inferior A 37° centígrados podendo eventualmente provocar queimaduras Do 1° grau. Os olhos, que sejam de preferência grandes E de rotação pelo menos tão lenta quanto a da Terra; e Que se coloquem sempre para lá de um invisível muro da paixão Que é preciso ultrapassar. Que a mulher seja em princípio alta Ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros. Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que, se se fechar os olhos Ao abri-los ela não mais estará presente Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer [beber O fel da dúvida. Oh, sobretudo Que ele não perca nunca, não importa em que mundo Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre O impossível perfume; e destile sempre O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.



Vinicius de Moraes

sábado, 8 de setembro de 2007


Gotas de Luar




Se eu pudesse roubar
as gotas de luar
que vi brilhar
nos olhos teus
guardava aquele encanto
para enfeitar meu pranto
na hora do adeus
Sei que muito breve
tu irás me esquecer
eu sei que vou sofrer
por culpa da minha paixão
eu devia te deixar
mas vou continuar
para castigar
meu pobre coração












Marisa Monte

Beija Eu


Seja eu,
Seja eu,
Deixa que eu seja eu.
E aceita
O que seja seu.
Então deita e aceita eu.
Molha eu,
Seca eu,
Deixa que eu seja o céu
E receba
O que seja seu.
Anoiteça e amanheça eu.
Beija eu,
Beija eu,
Beija eu, me beija.
Deixa
O que seja ser
Então beba e receba
Meu corpo no seu corpo,
Eu no meu corpo,
Deixa,
Eu me deixo
Anoiteça e amanheça





Marisa Monte

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Nada




Nada começa e nada termina,morno,


quieta...bem quieta eu suspiro,


percebo que a vida ainda existe


e que B.B King esta no meu ouvido


com sua canção Laundromat Blues


e tudo já empalidecido acaba morrendo


só, somente só o pensamento vai longe,vai...foi!


a melancólica rotina esta a martelar


como um metronomo num infernal 4/4,


não damais pra aguentar,


ja costurei o céu


com as cordas do meu violão,


ja deixei o meu quarto para a morada


dos anjos mas, mesmo assim, mesmo assim


tudo vive e em mim nada acontece,


de saco cheio, não quero escrever mais nada não.








Nisseli Velocipe.

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Aracaju, Caetano Veloso

http://www.youtube.com/watch?v=w8I0bzlcWIQ

A mesma mão que bate também faz carinho


Tem muita gente que sente falta da educação do passado. Há 30 anos, a escola – segunda etapa do processo socializador do homem, sendo a família a primeira – no contexto da ditadura militar, absorveu os valores da antiga moral familiar e, em detrimento dos estudantes, legitimou a ação de professores autoritários e arrogantes. Como resultado, a relação entre estudantes e professores estabeleceu-se de forma extremamente desigual.
Naquela época, os professores – tidos como únicos possuidores do saber válido, o que automaticamente rebaixava os estudantes à condição de alunos (palavra derivada do latim que significa ausência de luz) – reprimiam duramente qualquer atitude que se opusesse ao comportamento por eles desejado. A escola, no intuito de moldar os estudantes segundo as premissas de cidadão ideal convenientes ao sistema vigente, ignorava as particularidades de cada um, tolhendo-lhes o direito de questionar qualquer ato que pusesse em xeque a moral do professor e mostrando grande desapreço à criatividade. A regra era não pensar.
Com o passar do tempo – acompanhando o processo de abertura política e modernização da sociedade brasileira – a antiga instituição educacional foi sendo modificada até chegar ao estágio atual. O freqüente problema de indisciplina nas escolas acarreta dúvidas quanta a eficiência da atual política educacional – esta preza pela participação efetiva do aluno no processo de aprendizagem, valorizando e respeitando suas individualidades – acalentando em alguns pais até certo saudosismo.
Seria um retrocesso se na dinâmica sociedade atual, em que a pluralidade de opções proporciona ao individuo a liberdade de construir seu próprio caminho, a escola retomasse o antigo regime educacional. Não obstante, é perceptível na sociedade em geral uma necessidade de fiscalização, de controle. Entretanto, a questão a ser debatida não é a conquista da liberdade – uma vez que esta é o direito de todos – e sim o que se fazer com a mesma. Pais e escola, ao invés de reprimir os jovens devem educá-los de tal forma que estes saibam decidir sozinhos o que melhor lhes convém.






Paulo César di Linharez.

ABSTRAÇÕES DE UM SEGUNDO PISO


Era uma praça de alimentação. Daquelas que reduzem o passo da acelerada rotina semanal. Daquelas que tem mesa e cadeira, vaidade e ansiedade. Daquelas, por muitas vezes, vazias de tanta gente.

Era uma moça. Daquelas que reduzem o passo dos acelerados olhares eventuais. Daquelas de ventre e coxas, vaidade e ansiedade. Daquelas que, por muitas vezes, guardam uma cadeira vazia ao lado.

E era um rapaz. Daqueles que aceleram o passo por medo de desistir e voltar. Daqueles de membro e olhos – vaidade e ansiedade. Daqueles que, por muitas vezes, guardam um espaço vazio entre os dedos.

De alimentação. Comum e recomendável que fosse.
Vão se os poetas. Ficam as praças.



Carlos Néri Out/2006

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

...



Tom Jobim - Retrato em Preto e Branco





Já conheço os passos dessa estrada

Sei que não vai dar em nada

Seus segredos sei de cor

Já conheço as pedras do caminho

E sei também que ali sozinho

Eu vou ficar tanto pior

O que é que eu posso contra o encanto

Desse amor que eu nego tanto

Evito tanto

E que no entanto

Volta sempre a enfeitiçar

Com seus mesmos tristes, velhos fatos

Que num álbum de retratos

Eu teimo em colecionar

Lá vou eu de novo como um tolo

Procurar o desconsolo
Que cansei de conhecer

Novos dias tristes, noites claras

Versos, cartas, minha cara

Ainda volto a lhe escrever

Pra lhe dizer que isso é pecado

Eu trago o peito tão marcado

De lembranças do passado

E você sabe a razão

Vou colecionar mais um soneto

Outro retrato em branco e preto

A maltratar meu coração .

domingo, 2 de setembro de 2007

Tão seu





Eu sinto sua falta
Não posso esperar tanto tempo assim
O nosso amor é novo
É o velho amor ainda e sempre
Não diga que não vem me verde noite eu quero descansar
Ir ao cinema com vocêUm filme à toa no Pathé
Que culpa a gente tem de ser feliz
Que culpa a gente tem, meu bem
O mundo bem diante do nariz
Feliz agora e não além
Me sinto só, me sinto só, me sinto tão seu
Me sinto tão, me sinto só e sou teu
Me sinto só, me sinto só, me sinto tão seu
Me sinto tão, me sinto só e sou teu
Eu faço tanta coisa
Pensando no momento de te ver
A minha casa sem você é triste
E a espera arde sem me aquecer
Não diga que você não volta
Eu não vou conseguir dormir
À noite eu quero descansar
Sair à toa por aí
Me sinto só, me sinto só, me sinto tão seu
Me sinto tão, me sinto só e sou teu
Me sinto só, me sinto só, me sinto tão seu
Me sinto tão, me sinto só e sou teu
Eu sinto sua falta
Não posso esperar tanto tempo assim
O nosso amor é novo
É o velho amor ainda e sempre
Que culpa a gente tem de ser feliz
Eu digo eles ou nós dois
O mundo bem diante do nariz
Feliz agora e não depois
Me sinto só, me sinto só, me sinto tão seu
Me sinto tão, me sinto só e sou teu
Me sinto só, me sinto só, me sinto tão seu
Me sinto tão, me sinto só e sou teu.
Skank.

ETA SONO...


Hay nao me deixou dormir, acredite se quiser...

ensaio jajá e o corpo ta moooorto de cansado...mas viva,viva,

viva MadQueen!!!!!!!!!!!!!!!

sábado, 1 de setembro de 2007

O ÚLTIMO SORTILÉGIO




"JÁ REPETI o antigo encantamento,
E a grande Deusa aos olhos se negou.
Já repeti, nas pausas do amplo vento,
As orações cuja alma é um ser fecundo.
Nada me o abismo deu ou o céu mostrou.
Só o vento volta onde estou toda e só,
E tudo dorme no confuso mundo.

"Outrora meu condão fadava as sarças
E a minha evocação do solo erguia
Presenças concentradas das que esparsas
Dormem nas formas naturais das coisas.
Outrora a minha voz acontecia.
Fadas e elfos, se eu chamasse, via,
E as folhas da floresta eram lustrosas.

"Minha varinha, com que da vontade
Falava às existências essenciais,
Já não conhece a minha realidade.
Já, se o círculo traço, não há nada.
Murmura o vento alheio extintos ais,
E ao luar que sobe além dos matagais
Não sou mais do que os bosques ou a estrada.

"Já me falece o dom com que me amavam.
Já me não torno a forma e o fim da vida
A quantos que, buscando-os, me buscavam.
Já, praia, o mar dos braços não me inunda.
Nem já me vejo ao sol saudado erguida,
Ou, em êxtase mágico perdida,
Ao luar, à boca da caverna funda.

"Já as sacras potências infernais,
Que, dormentes sem deuses nem destino,
À substância das coisas são iguais,
Não ouvem minha voz ou os nomes seus,
A música partiu-se do meu hino.
Já meu furor astral não é divino
Nem meu corpo pensado é já um deus.

"E as longínquas deidades do atro poço,
Que tantas vezes, pálida, evoquei
Com a raiva de amar em alvoroço,
Inevocadas hoje ante mim estão.
Como, sem que as amasse, eu as chamei,
Agora, que não amo, as tenho, e sei
Que meu vendido ser consumirão.

"Tu , porém, Sol, cujo ouro me foi presa,
Tu, Lua, cuja prata converti
Se já não podeis dar-me esta beleza
Que tantas vezes tive por querer,
Ao menos meu ser findo dividi -
Meu ser essencial se perca em si,
Só meu corpo sem mim fique alma e ser!

"Converta-me a minha última magia
Numa estátua de mim em corpo vivo!
Morra quem sou, mas quem me fiz e havia,
Anônima presença que se beija,
Carne do meu abstrato amor cativo,
Seja a morte de mim em que revivo;
E tal qual fui, não sendo nada, eu seja!"












Fernando Pessoa